terça-feira, 23 de outubro de 2012

Dia de índio

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A temática indígena ontem esteve bem presente na minha rotina. À tarde vi rapidamente postagens no facebook sobre o anúncio de suicídio coletivo de índios Guaranis Caiovás no Mato Grosso do Sul enquanto à noite travei um diálogo acirrado com alunos do ensino médio sobre os indígenas no Brasil, ao introduzir a temática “História dos povos indígenas do Tocantins”, constante da proposta curricular que a inclui entre os conteúdos a serem ministrados no ensino médio.

Impressionante o quanto ignoramos a questão indígena ou temos uma visão equivocada das relações que se devem estabelecer entre indígenas e não-indígenas no território brasileiro! Neste caso, a visão que muitos alunos apresentam é nada mais nada menos que aquela que foi ensinada durante muito tempo pela escola ou que é compartilhada por pessoas que têm uma visão desenvolvimentista do país, segundo a qual os índios se apresentam apenas como empecilho ao desenvolvimento. E na condição de professor, uma vez ciente da força desse pensamento anti-indígena presente inclusive na nossa comunidade, acredito que é minha responsabilidade situar os alunos numa análise dos condicionantes históricos que geraram esse tipo de pensamento, em vez de simplesmente taxá-los de desumanos, capitalistas ou coisa do tipo. Percebe-se a partir disso o quanto a escola historicamente tem ignorado temáticas importantíssimas para a garantia de direitos a todos os brasileiros e, portanto, acirrado o pensamento e atitude de não indígenas contra cerca de 230 etnias indígenas que habitam o país, um número significativo, a despeito de cinco séculos de extermínio em que mais de cinco milhões de índios se reduziram a menos de 5% da quantidade original.

Reavaliar as ações docentes pode ser uma alternativa para que futuramente não estejamos assistindo a grupos indígenas anunciarem o próprio suicídio diante de uma indiferença governamental que só não é maior do que a indiferença dos brasileiros em geral. O mesmo se pode dizer em relação a muitos outros grupos historicamente massacrados, como aqueles que não dispõem de terra para trabalhar, por exemplo, em razão dos processos tradicionais de distribuição de terra no Brasil (capitanias, sesmarias, grilagem). Para muita gente, sem-terra e indígenas representam apenas atraso para o país, uma vez que a ideia de humanização e convívio pacífico dos povos foi substituída pela de produção e consumo inconsequentes.

Este é o Brasil – e por que não dizer o mundo! – das desigualdades. E estes somos nós, seres “humanos”.

2 comentários :

  1. A ideia de que o índio representa um obstáculo ao desenvolvimento, se dá em função de que grandes áreas do território nacional se constituem em reservas indígenas. Alem disso, essas reservas estão quase sempre localizadas em áreas estratégicas para a expansão agrícola, ou, encontram-se sobre gigantescas jazidas minerais. Isso, sem falar nas riquezas representadas pelos ainda vastos recursos vegetais madeireiros e não madeireiros, só acessíveis mediante condições especiais onde o rigor da legislação indigenista impõe sérias restrições.

    A bem da verdade, as dificuldades de relacionamento entre índios e não índios, se devem a fatores residuais que remontam ao período colonial brasileiro, quando os invasores europeus, diante dos costumes singulares dos indígenas passaram a ter em conta que índio era um pouco menos que gente. A religião, as relações sociais e os costumes em geral entravam em choque direto com a sofisticada civilização européia, de forma que pouca coisa daí se aproveitava. Obviamente que o tempo, e a natureza tropical se encarregaram de proporcionar um ajuste de condutas, e tanto índios quanto europeus foram adotando o que julgavam mais conveniente da cultura adversária, não sem prejuízos, principalmente para os índios, que viram-se usurpados de tudo que construíram e guardaram zelosamente ao longo de milênios.

    Sabemos que não foi uma transição pacífica. Houve conflitos sangrentos, mas as relações de força eram imensamente desfavoráveis aos índios, afeitos a conflitos tribais necessários à manutenção se suas soberanias. As lutas entre índios e europeus, quase sempre tinham como resultado o extermínio de aldeias inteiras, com poucas baixas entre os invasores melhor preparados em armas e táticas de guerra.

    E assim, o saldo que se tem hoje, do que poderia ter sido um rico intercambio comercial e cultural, é a redução da população indígena para cerca de um quinto da que havia na época do “descobrimento”; cerca de quinze etnias extintas, e outras tantas reduzidas a simples mestiços, já totalmente desprovidos de cultura ancestral, e a idéia geral de que índio é mentiroso e não quer nada com trabalho, preferindo ocupar seu tempo tomando pinga e fumando “diamba” ou algo equivalente.

    Comentário extenso? Sim. Muito! Espero, com ele, ter contribui com o texto do professor Sulo, nessa oportunidade em que tenta resgatar o respeito devido a esses a quem costumamos chamar de verdadeiros brasileiros

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    1. Uma abordagem impressionante, Juno, digna de uma publicação com espaço que não fosse a de um simples comentário.

      Sinta-se sempre bem vindo a este simples espaço de publicação docente.

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