Frequentar a sala de aula nos concede a oportunidade
angustiante de perceber a dinâmica sutil que as disputas de poder apresentam no
cotidiano escolar. Disputas de poder, sim, entre professores e alunos. Não se
trata de uma rígida batalha entre forças antagônicas, na medida em que os
alunos não são iguais e alguns fogem aos objetivos da maioria da turma. Vejamos
algumas dessas manifestações.
Inicialmente cabe dizer que estou meio afastado de leituras pedagógicas que apresentem, porventura, sistematicamente essa dinâmica de relações de poder na sala de aula, suas categorizações específicas, e, em razão disso, apresentarei aqui algo segundo o meu próprio modo de ver as coisas e atribuirei denominações também próprias para as diversas situações representativas dessas manifestações de poder. Cabe também dizer que essas disputas são norteadas por valores que subjazem a todas as atitudes demonstradas por ambos os lados. Na maioria das vezes o professor pode representar uma tentativa de promover o diálogo sadio, a aprendizagem, a formação efetiva dos alunos; da parte da maioria dos alunos, pode tratar-se de como evitar tudo isso. Não por pura oposição ao trabalho do professor ou da escola, mas por não disporem realmente de vontade de aprender, pelo menos não da maneira como eu, professor, considero significativo. Em algumas situações podem simplesmente estar protestando contra o modo de ser ou de agir da escola ou do professor, ou mesmo de tudo. De todo modo, parto aqui da premissa que afirma tratar-se realmente de aversão ao saber que a escola pretende ensinar.
Uma dessas manifestações de exercício de poder dos alunos diz
respeito às circunstâncias em que fica evidente sua indiferença em relação às
aulas e, que, apesar disso, o professor insiste em chamar sua atenção. Coerentes
com a indiferença, preferem manter pares de diálogo em meio tom, pois acreditam
que assim não atrapalham a aula para
quem está interessado. Seria uma forma tácita de demonstrarem que o melhor que
podem fazer é ficarem sentados no seu lugar numa quase que silenciosa conversa
com o colega do lado e que da parte do professor basta que não se importe com
isso. Uma expressão típica dessa atitude dos alunos diante dos professores é: “Dê
sua aula, moço, e nos deixe em paz!” Pronunciada na maioria das vezes de forma agressiva,
a expressão denuncia seu caráter de resistência ao poder do professor no
exercício da aula, ao mesmo tempo em que estabelece marcos para a atuação
escolar indiferente. Ano passado ouvia isso quase que diariamente de uma aluna
que insistia em ignorar as aulas ao preferir conversar com uma colega de turma.
Uma postura, também de caráter de resistência às aulas,
ocorre da parte daqueles alunos que preferem um tipo de professor que os deixe
bem à vontade, que não exija deles participações nas discussões ou que encerre
mais cedo a aula. Ao tentar fomentar as discussões replicam: “Professor, tudo ficou
muito claro!” Os resultados das provas seguintes demonstram que se tratava
apenas de evasiva discente, exercício de poder na sala de aula em favor da
indiferença estudantil.
Outras formas dessa resistência podem ainda ser percebidas:
o aluno que resolve apontar o lápis quando ninguém precisa escrever, o que pega
uma folha em branco e resolve fazer um desenho, o que começa a digitar
freneticamente a calculadora, o que dorme, o que pede pra ir no banheiro, etc.
Tudo para fugir da aula! Muitos poderão questionar se não se trata do caráter
monótono das aulas, da insegurança do professor ou da incapacidade deste em
chamar à atenção os alunos. Sem de todo desfazer dessa possibilidade, defendo a
ideia de que se trata mesmo de um sintoma geral de um mal maior: aversão ao
saber!
Começaríamos então a partir daí, caso quiséssemos resolver o
problema. É preciso fomentar uma cultura de aprendizagem, de valorização do
saber. Quem sabe se o exercício do poder discente não se dará em favor de
objetivos mais nobres, como por exemplo, exigindo mais esforço do professor,
leitura, compromisso, ensino de qualidade.
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