Edilene (Dila) |
Não pude escrever nada por ocasião do último 8 de março. Exatamente
ontem assisti e sofri o adeus de uma grande mulher, minha irmã Edilene, exemplo
de força, coragem e solidariedade. Aproveito, entretanto, este momento
posterior para falar dela e das mulheres em geral, sobretudo da forma como as
tenho considerado em minha prática educativa.
Conforme deixou registrado no último escrito seu (ela fez
vários textos mas os destruiu a todos), minha irmã fez de tudo pra nos privar
de todo o sofrimento que se abatera sobre sua vida desde o início do ano. Em
nenhum momento permitiu a presença de irmãos e pais junto dela e sempre se
mostrou forte e consoladora a despeito de ela estar na condição de alvo de consolação
e encorajamento. Mesmo alguns minutos antes da cirurgia ela me ligou e se
colocou na situação de quem estava oferecendo consolo e encorajamento, ainda
que vacilante e quase afônica, e, para minha dor e vergonha posterior, não
retribuí no momento na mesma medida ou além dela.
A força e ânimo de Edilene é sinal da força da mulher que não
é menor em grau ou extensão que a dos homens nem é a mulher inferior ao homem
de maneira nenhuma que justifique qualquer forma de opressão daquelas. O
semideus Aquiles empunhou uma espada tanto quanto a heroína francesa Joana
D'Arc. Esta uma personagem história real, aquele um ser carregado dos
ornamentos divinos próprios da mitologia dos gregos. E, ainda no contexto dos
cantos homéricos, quem diria que Penélope foi inferior nos seus esforços contra
os pretendentes – tão mais reais e cotidianos – aos de Ulisses contra as
intempéries míticas de seu retorno à Ítaca!
A história, posto que espaço masculino, não está de todo
esvaziada de evidências da presença feminina, a despeito da tentativa dos
escritores de mantê-la sempre à parte. E os vestígios, ainda que alardeados
apenas os que apresentam as marcas do homem, não silenciam quando são
investigados do ponto de vista de uma história das mulheres. É fato, porém, que
historicamente o que foi preservado o foi do ponto de vista de uma história dos
homens.
Embora me faltem no momento elementos de pesquisa que deem
conta dessas afirmações é inegável que a história do gênero humano é uma
história de conflitos, tensões, de lutas em que predominou por muito tempo uma
configuração social com papeis próprios para homens e mulheres em que estas
foram submetidas a situações indignas, desumanas, cruéis, mas não de pura
submissão, condescendência, e sim de conflitos mesmos, subversão, negociações,
perdas e ganhos cujos benefícios parecem beneficiar as mulheres melhor no tempo
presente.
Se na aparentemente tirânica Esparta as mulheres atenienses
eram as que “davam à luz homens de verdade”, na Atenas democrática as mulheres
e os escravos eram excluídos da cidadania. E foi uma mulher, Diotima, e não o
homem Sócrates, que Platão escolheu para expressar a sublimidade do eros platônico. No Antigo Testamento
hebraico as mulheres hebraicas também profetizavam ou exerciam muito grande
influência em seus governos, o que demonstra a existência de espaços
conquistados não por dádiva masculina, mas como evidência das tensões em torno
da constituição dos papeis sociais em todo o tempo e lugar. No Novo Testamento,
a despeito da visão geral que se mantém desse documento como espaço machista,
sabemos da influência feminina na corte de Herodes e no serviço cristão da
Igreja Primitiva. Na Idade Média, convencionalmente vista como escuridão
machista e ignorante e submissão da mulher, sabemos também desses conflitos,
principalmente das senhoras viúvas que precisavam se estabelecer em seus
domínios quando da morte dos cavaleiros, enfrentando cortes compostas por
homens e leis que as queriam maltratar[1].
Não se quer aqui subestimar a opressão masculina, mas afirmar que em vez da
pura submissão houve o seu par, a resistência, que apesar de tudo não tornou a
situação igualitária.
Enfim, e a título de encerramento, é preciso ver a história
também como história das mulheres, da opressão mas também da resistência, da
desigualdade de gênero mas também da luta contra a desigualdade. O momento
presente parece ser um ápice dessas lutas, mais muito ainda falta, inclusive
uma compreensão coerente do que é realmente a dignidade feminina, pois há
confusão sobre o que seria isso. Uma questão a ser discutida é: que papeis são
atribuídos hoje às mulheres e a quem servem? Sabemos que a lógica do capital
submete as mulheres e a erotização feminina à logica do mercado sob a roupagem
da liberdade sobre o próprio corpo. Há muitos outros aspectos da famigerada
liberdade da mulher que precisam ser questionados hoje, pois isso favorece o
direcionamento das lutas para o front
em que elas de fato devem ser travadas. Esta é a minha forma de dar neste 09 de
março o meu parabéns fora de data a todas as mulheres e lembrar a recente luta
de minha irmã, uma grande mulher.
A evolução da sociedade fez surgir a mulher chefe de família, empreendedora, trabalhadora, batalhadora. No entanto, ainda existem homens e mulheres que não exergaram a luz dessa nova realidade e insistem na manutenção da submissão das mulheres aos seus maridos, pais e companheiros.
ResponderExcluirMuito bem, Sérgio Gomes!
ExcluirE ainda se subestima.
Em 08 de março de 1911, mais de um milhão de mulheres comemoraram, pela primeira vez, o Dia Internacional da Mulher.
ResponderExcluirEm 08 de Março de 2013 eu chorei pela morte de uma...( Dila ) Saudades...