A
leitura na escola só faz sentido se for uma leitura livre. É por isso que nas
bibliotecas escolares há materiais de todos os tipos, textos de todos os
gêneros, pois nem todos gostarão somente de romance infanto-juvenil ou de
literatura de cordel. Pontificar sobre isso como o fez Harold Bloom, de forma
negativa, ao questionar a validade da leitura da obra de J.K. Rowling (a saga
Harry Potter), só contribui para agravar o quadro de aversão à leitura
observável hoje nas escolas públicas brasileiras.
No
caso de Bloom, isso pode ser resultado daquilo que Brandão denomina de “(...)
preconceito em relação a determinadas obras que, por não pertencerem ao cânon,
são consideradas não literárias”.[1] De
um ponto de vista de fomentar a leitura na escola essas considerações não fazem
sentido, cabendo ao aluno, inclusive com o auxílio dos professores, fazer
considerações sobre essas questões valorativas depois de lida a obra.
Por
outro lado, a saga Harry Potter
também foi vítima de considerações religiosas sobre o caráter místico da obra e
para um grande público de orientação evangélica essa leitura representaria a
contaminação de mentes cristãs jovens com a bruxaria, o satanismo. Brandão também
fala dessa reação nas redes sociais, por ele denominada de “apologia ao
satanismo”.[2]
Pode-se supor, porém, que essa reação é mais fruto de um anti-intelectualismo
mais geral dos grupos religiosos populares do que uma avaliação bem feita que
precedesse a uma recomendação sóbria aos jovens cristãos. O
anti-intelectualismo cristão reduz todas as leituras somente à bíblia e sem
considerações teológicas mais aprofundadas, quando o ideal seria promover nos
meios eclesiásticos uma elaboração de um quadro de referência teológica e
filosoficamente consistente com os princípios cristãos que servisse de modelo
para os jovens julgarem todas as suas leituras a partir desse quadro. Há muitos
cristãos eminentemente leitores e que não leem apenas teologia. O fato é que
leem tudo sob uma consistente ótica cristã. O bom senso cristão não
prescreveria uma espécie de index
librorum proibitorum, mas prepararia os cristãos para lerem inclusive a
saga Harry Potter.
Talvez
esse seja o caminho que a escola – e os professores – também deve trilhar: em
vez de selecionar entre este e aquele livro para aquisição ou indicação para os
alunos que os preparasse para avaliarem as leituras feitas com autonomia e
senso crítico.
*Atividade solicitada pela Faculdade para discutir a interferência do professor na leitura dos alunos, a partir da crítica feita por Harold Bloom à saga Harry Potter.
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