sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Cadê a motivação?

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Todo dia de aula é dia de reflexão sobre por que nossos alunos não são motivados para os estudos. A própria ausência ou não da motivação é algo a ser questionada, na medida em que quem fala de motivação para algo fala a partir da visão deste algo, algo este que pode ser apenas uma previsão ou idealização do professor ou da escola e não do aluno. Não se trata de dizer que nossos alunos não têm projetos ou não idealizaram nada em relação aos estudos, mas que as idealizações deles não convergem com aquilo que muitas vezes estabelecemos cotidianamente e que tanto nos angustia ao vê-los distanciados de nossas idealizações.

Um exemplo. Posso idealizar um aluno leitor que compreenda uma minha referência, ainda que vaga, à doutrina das ideias de Platão, ao Selvagem de Huxley, ou aos olhos de ressaca, da Capitu de Machado de Assis, ao expor algum assunto referente às minhas aulas, enquanto esse mesmo aluno pode considerar que concluir o ensino médio não tem nada a ver com ter que ler este ou aquele romance ou dominar rudimentos de filosofia. Infelizmente este é o perfil de muitos de nossos alunos. Neste sentido, por que teriam motivação para algo que não consideram constante de suas idealizações? Seria ingênuo, então, da nossa parte cobrar essa motivação, mas não o seria fazê-los refletir sobre as idealizações deles.

Afinal, a partir de que contexto nossos alunos elaboram suas expectativas, projetos, idealizações? O contexto de que fazem parte nossos alunos é o da vida campestre ou de cidade pequena, simples, cujas idealizações são forjadas pela cultura antiintelectualista local e pela indústria cultural (todos têm acesso à TV aberta e uma grande parte à internet) e dizem respeito, na maioria das vezes, apenas ao ingresso no mundo do trabalho e do consumo, reforçada ainda por ideais religiosos que apregoam o paraíso celestial à expensas de responsabilidades terrenas e das reflexões que lhes são inerentes. Muitos de nós, professores, oriundos residentes em contextos semelhantes, também compartilhamos desses mesmos ideais e expectativas e os reforçamos na prática escolar através da execução visível de nossos papeis sociais. Às vezes conseguimos até ultrapassar esses ideais e expectativas, mas nos esquecemos de que a maioria de nossos alunos não o faz.

Daí, então, a necessidade de forjarmos novas expectativas para nossos alunos que demandem motivações correspondentes. E isso não se fará sem uma prática efetiva de revisão do que nós, escola e agentes escolares, estabelecemos cotidianamente enquanto ideais, expectativas, projetos de futuro. Uma revisão que perpasse não só a escola, mas as instituições formadoras que contribuem para o processo formativo da identidade local.

Até lá é bom nos acomodarmos à ideia de que nossas projeções não são as mesmas de nossos alunos.

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